PF diz que quadrilha tinha informações privilegiadas do mercado financeiro
As investigações da Polícia Federal na Operação Satiagraha revelaram como duas organizações criminosas agiam de forma coordenada para movimentar bilhões no exterior. E indicam que a quadrilha teria informações privilegiadas sobre o mercado financeiro.
O despacho do juiz federal volta no tempo, até 27 de outubro de 2004. A operação Chacal, da Polícia Federal, investigava a empresa Kroll, acusada de espionar autoridades do governo federal a mando do banqueiro Daniel Dantas.
Um disco rígido foi apreendido em um computador no Banco Opportunity. Foi neste arquivo que a Polícia Federal encontrou informações consideradas valiosas.
São dados sobre fundos de investimentos administrados pelo banco, como o Opportunity Fund. Em tese, um fundo criado para que estrangeiros investissem em ações de empresas brasileiras.
Mas, dos mais de R$ 6,5 bilhões administrados pelo fundo, aproximadamente R$ 3 bilhões seriam provenientes de paraísos fiscais.
Para a Polícia Federal, um truque utilizado por brasileiros que usavam doleiros para enviar dinheiro para esses fundos, investir em empresas brasileiras e não pagar um centavo de Imposto de Renda.
?Três bilhões aplicados aqui por um ano, em títulos públicos, rende aqui 300 milhões. Se fosse em um ano, a alíquota do Imposto de Renda seria 20%, seria 60 milhões. Se é um investidor estrangeiro, ele não precisa pagar esses 60 milhões?, explica o economista Roberto Troster.
A Polícia Federal conseguiu na Justiça as quebras de sigilo bancário, fiscal, telefônico e até eletrônico dos envolvidos, que revelaram novas irregularidades.
O resultado foi a descoberta de duas organizações criminosas, segundo a polícia. Uma comandada pelo empresário Naji Nahas, em São Paulo, e a outra chefiada no Rio de Janeiro, pelo banqueiro Daniel Dantas.
Os dois grupos se uniram para, segundo a investigação, cometer os crimes de gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, formação de quadrilha e tráfico de influência.
O grupo chefiado por Daniel Dantas atuava por meio de empresas de fachada, operadas por testas-de-ferro, com o principal objetivo de desviar verba pública, de fundos de pensão e de empresas estatais - o que, segundo a polícia, caracteriza crime de gestão fraudulenta.
O grupo do empresário Naji Nahas atuaria no mercado financeiro, com empresários e doleiros para lavar o dinheiro obtido nos negócios ilegais.
Segundo a polícia, ele agia no mercado de capitais com informações privilegiadas e negociava em nome de terceiros. Com o auxílio de doleiros, facilitava o retorno de divisas - incluindo as do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta.
As investigações mostram ainda que Naji Nahas sempre operava por meio de terceiros e encontraram indícios de que ele recebeu informações privilegiadas sobre a taxa de juros do Federal Reserve - o banco central americano.
Em um diálogo gravado em 29 de agosto de 2007, uma pessoa em Nova York contou para Nahas que a taxa de juros nos Estados Unidos iria cair em até meio por cento. A previsão, segundo os policiais, se confirmou em 18 de setembro - para surpresa dos mercados financeiros de todo planeta.
"Há indício de fraude no Federal Reserve. Muito nos surpreendeu da habilidade do senhor Naji Nahas, devido a um megacontato que ele teria no Brasil e no exterior, e nos conduziram até indícios de manipulação do mercado financeiro internacional e até mesmo na taxa de juros do Federal Reserve, onde ele se privilegia antecipadamente de informações e passa a aplicar no mercado financeiro nacional a se valer dessas informações", ressalta Protógenes Queiroz, delegado da Polícia Federal.
Nos Estados Unidos, o assessor de imprensa do Fed Ben Hardway informou que o banco central americano não comenta ações criminais.
Nahas também é suspeito de lucrar com informações privilegiadas sobre a Petrobras. Segundo a investigação, em abril deste ano, ele disse para um homem chamado Miguel comprar mais ações da empresa. Miguel alerta que elas estão caindo. Nahas teria dito para Miguel fazer o que ele mandava e para não comentar nada.
Uma semana depois, o diretor da Agência Nacional de Petróleo (ANP) anunciou a descoberta de um novo megacampo de óleo na Bacia de Santos. As ações da empresas subiram.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), responsável pela fiscalização do cumprimento de normas do mercado financeiro, pediu informações ao Ministério Público Federal sobre o caso.