Garantia federal
Vicente Nunes
Da equipe do Correio
O Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) foram escalados pelo governo para intervir no mercado se a atual crise internacional empurrar o país para uma escassez de crédito. O Palácio do Planalto e o Ministério da Fazenda estão assustados com a possibilidade de faltar dinheiro para investimentos produtivos e em infra-estrutura e para os consumidores, derrubando de forma acentuada o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no ano que vem.
Desde a segunda-feira, quando quebrou o quarto maior banco de investimentos dos Estados Unidos, várias pequenas instituições suspenderam operações de crédito porque não tiveram como abastecer os cofres. ?A orientação é para que não haja um estrangulamento no crédito que implique redução da atividade econômica em 2009?, disse ao Correio Braziliense o vice-presidente de Finanças e de Mercado de Capitais da Caixa, Márcio Percival.
Pelas determinações do governo, o Banco do Brasil vai incrementar o crédito rural, facilitar as exportações e os empréstimos e financiamentos a pessoas físicas. À Caixa, foi designada a responsabilidade de ampliar a oferta de recursos para a casa própria, para saneamento básico e para micro e pequenas empresas, principalmente. O BNDES cuidará do crédito à produção e à infra-estrutura, com a possibilidade, segundo afirmou o presidente Lula em entrevista à TV Brasil, de burlar os limites que impendem a instituição de concentrar financiamentos em uma mesma empresa. Essa brecha tem como alvos principais a Petrobras, que está tocando pesados investimentos para a exploração de petróleo nas camadas pré-sal, e a mineradora Vale.
Segundo Percival, a presença mais forte dos bancos públicos no mercado de crédito não significará, necessariamente, assumir mais riscos. ?Na verdade, estamos vendo um grande potencial de ganho, pois o crédito tem sido um bom negócio para os bancos?, assinalou. Para o executivo da Caixa, os bancos privados que recuarem em suas estratégias de financiar a produção e o consumo vão perder mercado, pois as instituições públicas estão capitalizadas o suficiente para botar o pé no acelerador. ?Estamos liberando R$ 4 bilhões da caderneta de poupança para o financiamento da casa própria daqui até o final do ano?, disse Percival. ?Esse é só um exemplo?, emendou.
Caro e curto
Na avaliação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, é justo que o governo monte uma estratégia para suprir o mercado de crédito, uma vez que já está havendo restrição de linhas de financiamento do exterior para bancos e empresas brasileiros. As que sobraram, em meio à derrocada de grandes instituições americanas e européias, estão cada vez mais caras e com prazos de pagamento muitos curtos, que inviabilizam o repasse no país. ?Se sentirmos essa escassez se prolongar, podemos tomar algumas medidas no sentido de estimular o crédito para investimento?, frisou. A estratégia, segundo Mantega, não inclui o consumo, apesar de ele estimular publicamente que as pessoas não se deixem contaminar pela crise externa e continuem comprando a prazo.
O ministro acredita que o quadro de escassez e encarecimento do crédito não tenderá a durar muito. ?É um problema que deve ser passageiro e será resolvido?, reforçou, assinalando ser pequeno o risco de a economia brasileira sucumbir aos estragos provocados pela crise internacional. ?Não vejo contaminação. E é bom que fique claro que o sistema financeiro brasileiro está sólido.?
Sócio-diretor da BDO Trevisan, o economista Márcio Peppe reconhece que os bancos brasileiros estão sólidos e capitalizados o suficiente para enfrentar a crise. Mas ele afirmou que a restrição de crédito para o país é visível. E os maiores prejudicados são os pequenos bancos. ?É natural que esses bancos optem por reforçar o caixa para que, quando o cenário melhorar, possam reforçar suas operações de crédito?, disse. ?Todos sabem que a crise está batendo às portas do Brasil e é preciso se preparar para ela?, enfatizou.
Mudança no BNDES
Da Redação
Se a crise de crédito continuar se agravando, o governo planeja mudar as regras de segurança que regem o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para facilitar empréstimos maiores. Hoje o banco tem um teto de concentração de financiamento para uma só empresa, que poderá ser abolido ou elevado para atender as maiores empresas brasileiras, avisou o próprio presidente Luís Inácio Lula da Silva em entrevista à TV Brasil.
?Nós estamos cuidando de garantir que as coisas aconteçam e sabemos que empresas grandes como a Petrobras, a Vale do Rio Doce, precisam de financiamento externo?, disse. ?Mas na hora em que ele rarear, nós vamos ter inclusive que mudar as normas do BNDES, que não pode emprestar uma determinada quantidade de dinheiro só para uma empresa, para que ele possa aumentar o volume de dinheiro emprestado.?
O governo, entretanto, deve aguardar os desdobramentos da crise financeira internacional antes de adotar qualquer medida mais dura, avisou. ?Nós não vamos tomar nenhuma medida precipitada. Nós estamos acompanhando isso com lupa. Na medida em que for necessário, nós vamos tomar medidas.?
Arrumar dinheiro
Ainda assim, deixou clara a preocupação com a redução do crédito para as empresas brasileiras que pode comprometer o crescimento econômico do país. ?Obviamente que, se rarear o crédito internacional e os empresários brasileiros tiverem dificuldade para tomar dinheiro emprestado, nós vamos ter que tomar uma decisão de arrumar mais dinheiro para que o BNDES possa emprestar?, avisou. Lula indicou que já estão sendo tomadas providências para aumentar o volume de recursos disponíveis. ?Nós já tomamos a decisão de emprestar mais R$ 15 bilhões para o BNDES e também de pegar o fundo de desenvolvimento com o dinheiro do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para repassar uma parte para o banco fazer os investimentos.?
Gigante pode ser afetado
O gerente-executivo de Finanças da Petrobras, Pedro Bonésio, afirmou ontem que a crise financeira global ?certamente? irá prejudicar captações no curto prazo. Ele disse, porém, que a companhia não tem necessidade de ir ao mercado este ano, uma vez que já conta com os recursos necessários para seu plano de investimentos. ?No curto prazo, está tudo resolvido. No médio e no longo prazos, esperamos que o mercado melhore?, afirmou o executivo, lembrando que os vultosos investimentos para desenvolver o pré-sal ainda vão demorar a ser executados.
Segundo ele, a Petrobras captou US$ 7,2 bilhões este ano, entre operações no mercado financeiro ? lançamento de bonds, por exemplo ? e empréstimos bancários. ?Mas, se a crise persistir, certamente afeta todo o mercado e nós também vamos sentir algum impacto. Nesse caso, todo mundo vai ter que refazer portifólio e revisar os investimentos?, comentou. Bonésio disse que a queda do petróleo no mercado internacional ainda não prejudica os investimentos da companhia.