Desaceleração econômica global leva o BC a manter os juros em 13,75%
A preocupação com o enfraquecimento da atividade econômica devido à crise internacional pesou mais que a inflação e levou ontem o Comitê de Política Monetária (Copom) a manter a taxa básica de juros do país em 13,75% ao ano, interrompendo um ciclo de quatro altas consecutivas. A decisão, encarada como uma possível parada técnica, era esperada por boa parte do mercado. Mas não seguiu a tendência de corte do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e outras autoridades monetárias mundiais.
Isso porque, como os preços continuam em alta por causa do dólar mais caro, o Banco Central (BC) poderá voltar a subir a Selic nos próximos encontros.
- Hoje é muito difícil fazer avaliações sobre a economia, porque a crise é severa. Essa parada do Copom é técnica porque não sinaliza que está encerrado o período de aperto monetário - afirmou o economista-chefe da corretora Concórdia, Elson Teles.
- A decisão de parar (de subir juros) agora foi acertada, porque o cenário é muito conturbado. Em dezembro, o BC pode voltar a subir, porque o dólar está afetando muito a inflação - afirmou o professor de economia da USP Fábio Kanzuc.
Planalto já esperava manutenção da taxa
A decisão de ontem foi unânime. O comunicado afirmava apenas que, "avaliando o cenário prospectivo e o balanço de riscos para a inflação, em ambiente de maior incerteza, o Copom decidiu por unanimidade, neste momento, manter a Selic em 13,75% ao ano, sem viés".
Avaliação reservada feita ontem à noite no Palácio do Planalto era que a manutenção dos juros e o anúncio de possibilidade de troca US$30 bilhões por reais com o Fed são duas armas poderosas para conter o ataque especulativo contra a moeda brasileira, que fez o dólar disparar nas últimas semanas. Um interlocutor direto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ressaltou que as duas ações coordenadas visam a reduzir a pressão sobre o câmbio hoje, dia em que será estabelecida a Ptax (taxa de referência para os contratos futuros), que vale para todo um mês.
- Se alguém pensava em fazer um ataque especulativo, agora terá de refazer as contas. Foi uma sinalização importante do Banco Central para defender o setor produtivo. Até porque, neste momento, nossa questão principal é o câmbio, não os juros - disse o senador Aloizio Mercadante (PT-SP).
No Planalto, a expectativa também era de manutenção. Nos últimos dias, Lula consultou o presidente do BC, Henrique Meirelles, várias vezes, recebendo sinais sobre essa decisão. O Ministério da Fazenda também celebrou.
- É uma decisão correta neste momento de maior incerteza -- afirmou o secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa. - A crise antecipou uma parada (na alta de juros) que a Fazenda esperava apenas para dezembro.
Desde abril, o Copom elevou a taxa em 2,5 pontos percentuais, preocupado com o avanço da inflação, decorrente do descompasso entre oferta e demanda. Na reunião anterior do Copom, em 10 de setembro, a alta foi de 0,75 ponto. O próximo encontro será em dezembro.
Desde setembro, o cenário econômico deu uma guinada: grandes bancos americanos e europeus quebraram, as bolsas de valores despencaram no mundo todo, o dólar estourou e o crédito sumiu dos mercados. Os principais dirigentes do BC já davam sinais de que haveria uma interrupção na alta dos juros.
Analista ainda vê pressão do dólar na inflação
Em conversas com economistas, por exemplo, o diretor de Política Econômica, Mário Mesquita, deixou claro que a preocupação do BC era com a atividade econômica. No mercado, muitas projeções apontam crescimento abaixo de 3% em 2009, contra 4,5% esperados antes da crise.
O setor produtivo aprovou.
- A decisão mostra que a freada econômica já veio, e o Copom percebeu isso e quer evitar mais desaceleração - disse o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, Eduardo Eugênio Vieira.
No mercado, havia algumas apostas de que o Copom poderia elevar os juros para segurar a inflação. O economista do banco Real Cristiano Souza esperava alta de 0,5 ponto. Para ele, a disparada do dólar já contaminou a inflação de 2009. Souza projeta IPCA de 5,5% ano que vem, acima do centro da meta do governo, de 4,5%.