Folha de salários já cresce menos na indústria
Com ajuste no nível de emprego e mantendo os reajustes salariais altos, a indústria está aos poucos conseguindo tornar menos pesados seus gastos com a folha de salários. Nos 12 meses encerrados em fevereiro, a folha de pagamento real da indústria subiu 4%. Embora muito acima da ocupação e da produtividade, esse percentual mostra um ajuste nesse custo pois é inferior a alta de 7% (em 12 meses) que persistiu ao longo de todo o primeiro semestre. Economistas divergem sobre a continuidade desse movimento, mas é consenso que o alívio de custos propiciado pela folha de salários do setor até agora é ínfimo em uma conjuntura de competição acirrada com importados e fraqueza da produção.
Esse menor crescimento do custo salarial foi provocado pelo ajuste no emprego e não no salário. Em fevereiro deste ano, a indústria mantinha um quadro de pessoal 0,5% maior que o de fevereiro de 2011 (considerando um período de 12 meses), enquanto o rendimento médio real do trabalhador se manteve, ao longo de todo o período, 3% acima da inflação.
O emprego industrial ficou estável ao aumentar 0,1% na passagem de janeiro para fevereiro, feitos os ajustes sazonais, segundo a Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (Pimes) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em relação a fevereiro do ano passado, no entanto, houve queda de 0,7%, quinta retração consecutiva e a maior nessa comparação desde janeiro de 2010. Apesar da estabilidade na comparação mês a mês, a Pimes mostra que, desde agosto do ano passado, a ocupação nas fábricas caiu 1%, com base no índice mensal com ajuste sazonal.
"A tendência é que a indústria não vá segurar seus funcionários por muito mais tempo", diz Nelson Marconi, coordenador do curso de graduação em economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP). O professor destaca que, nos 12 meses encerrados em fevereiro, o número de horas pagas na indústria caiu 0,2% e o emprego avançou 0,5%, quadro que indica sobra de pessoal. O ajuste, como vem ocorrendo, pondera Marconi, será lento, mas resultará em aumento cada vez menor da folha de salários do setor pelo lado da ocupação.
Para o professor da FGV, a desoneração da folha de pagamentos de mais ramos da indústria é outro fator que pode influenciar a desaceleração da folha total de salários do setor, embora não seja suficiente para garantir uma retomada mais consistente da produção, que continuará sofrendo com o câmbio valorizado e falta de competitividade. Em 12 meses, a folha de pagamento do segmento de máquinas e equipamentos - um dos agora livres de contribuição de 20% sobre a folha - aumentou 5,6%, mais de um ponto percentual acima da média.
Mais pessimista, o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, acredita que o pacote de incentivo do governo foi feito às pressas e não deve resultar em alívio expressivo de custos, o que, portanto, não garante que a folha de salários da indústria continue perdendo fôlego. Vale também vê como insuficiente para reduzir gastos a desaceleração já registrada na folha de pagamento real. "Ela ainda cresce muito acima da produtividade e coloca perigo à competitividade de toda a indústria", diz. Nos 12 meses encerrados em fevereiro, a produtividade encolheu 0,8%.
Fabio Ramos, da Quest Investimentos, sustenta que a perda de fôlego da folha de pagamento real da indústria é um movimento pontual, já que seu cenário ainda contempla dissídios robustos e estabilidade no nível de emprego do segmento. "Os reajustes nominais serão menores, mas como a inflação também será menor, na prática o trabalhador não terá perda", explica. Segundo cálculos do economista, o custo unitário do trabalho na indústria aumentou 12,5% desde 2010. "Isso é um indicador genuíno de pressão dos salários."
Assim como Ramos, a economista Alessandra Ribeiro, da Tendências Consultoria, vê um mercado de trabalho apertado, que gera ganhos reais ainda altos em outros setores da economia e que são repassados por tabela à indústria. "Não tem como a indústria não ser afetada por essa dinâmica. Ela compete pelo fator trabalho com outros setores e se não conceder reajuste, perde pessoal", explica.
Como Alessandra também aposta em recuperação um pouco mais forte da produção industrial - a Tendências projeta alta de 2% para 2012, contra o 0,3% registrado em 2011 -, não vê espaço para um alívio maior do lado da folha de pagamento real.
Com emprego patinando e produção aumentando pouco, Ramos não descarta algum ganho de produtividade na indústria, que, contudo, não será considerável. Entre janeiro e fevereiro, cálculos dessazonalizados pela Quest mostram alta de 0,4% da produtividade, o que, para ele, indica estabilidade. "Ela pode até melhorar um pouco, mas nada que reverta o conjunto fraco dos últimos dois anos". Em 2011, a relação entre produção e horas pagas na indústria caiu 0,2%.
Fiesp registra 4,5 mil demissões em março, pior resultado para o mês desde 2006
O crescimento abaixo do esperado do setor sucroalcooleiro em março foi o principal responsável pela queda no nível de emprego da indústria de transformação paulista, de acordo com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). No mês, o setor criou 4.163 vagas, o que representa avanço de 10,8% na comparação, sem ajuste sazonal, com o mês anterior. Desde o início da série, em 2006, o setor não crescia menos do que 17%, na mesma comparação.
Para o diretor do departamento de pesquisas e estudos econômicos da entidade, Paulo Francini, o setor enfrenta claros problemas. Apesar de o açúcar estar com preços favoráveis no mercado externo, o álcool sofre com a concorrência com a gasolina no mercado interno, diz ele.
"A vantagem de uso do álcool em relação à gasolina desapareceu. A Petrobras manteve o preço do combustível por três anos, mas o custo das usinas não ficou estável", explica Francini. "É difícil produzir sem saber se você vai vender. Isso afeta a disposição dos produtores para expandir o plantio."
O nível de emprego da indústria de transformação paulista caiu 0,87% em março, ante fevereiro, considerados os ajustes sazonais. Sem ajuste, o emprego caiu 0,18%, com a demissão de 4.500 empregados. Foi o pior março desde 2006. Até então, na comparação sem ajuste sazonal, o mês não tinha apresentado resultado negativo. Na comparação dessazonalizada, o pior registro em seis anos tinha sido queda de 0,10% em 2006.
"A geração de empregos e a indústria de transformação vão mal", diz Francini. No ano, a tendência, de acordo com a Fiesp é que o emprego fique estável. O diretor acredita em uma retomada lenta do setor a partir de junho, mas diz que ela não será suficiente para fazer o emprego crescer.
Nos três primeiros meses, o emprego na indústria paulista apresentou quedas de 0,10%, 0,26% e 0,87%, respectivamente, na comparação com os meses imediatamente anteriores, com ajuste sazonal. "Não sentimos sinais de que vai haver uma reativação na indústria de transformação com as medidas que foram anunciadas pelo governo. Não vai ser o setor que vai puxar o PIB este ano, mais uma vez", diz Francini.
Dentre os 22 setores analisados em março, 13 demitiram, 7 contrataram e 2 ficaram estáveis. Entre os segmentos que mais demitiram está o de produtos de metal (exceto máquinas e equipamentos), com fechamento de 2.463 postos de trabalho, queda de 1,1% na comparação com fevereiro. A indústria de produtos alimentícios cortou 1.536 vagas (-0,40%) e o setor têxtil eliminou 871 vagas (-0,80%).
Fonte: Valor Econômico