Juros mais altos
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central surpreendeu boa parcela do mercado financeiro e provocou grande desapontamento dentro do governo ao elevar ontem a taxa básica de juros (Selic) em 0,5 ponto percentual, de 16,25% para 16,75% ao ano. Havia quase um consenso entre os especialistas de que, com a queda dos índices de inflação nas últimas semanas, o Copom seria menos agressivo e continuaria com sua política gradualista de aumento de 0,25 ponto ao mês na Selic até o final do ano, atingindo 17%.
Mas os oito diretores do BC que integram o Comitê não se renderam ao otimismo e deram demonstração unânime de que querem ver os índices de preços de 2005 convergindo o mais rapidamente possível para a meta de 5,1% que vem sendo perseguida. Há projeções apontando para inflação de 6% no ano que vem. Na lacônica nota divulgada à imprensa para justificar o aumento de 0,5 ponto da Selic, o BC ressaltou que estava dando ??prosseguimento ao processo de ajuste moderado?? dos juros iniciado no mês passado, quando a taxa subiu 0,25 ponto.
Um dos pouquíssimos analistas que apostavam na elevação de 0,5 ponto da Selic, o economista Nuno Câmara, do Dresdner Bank em Nova York disse ao Correio que a decisão foi acertada e reflete a intolerância do BC com a alta da inflação. ??Muitos vão criticar o Banco Central. Várias pessoas vão dizer que o aumento dos juros inibirá os investimentos produtivos, o que poderá até ocorrer na margem. Mas, na verdade, o que o BC fez foi dar previsibilidade aos empresários ao ratificar seu compromisso com a estabilidade econômica e com o crescimento sustentado??, afirmou.
Equívoco
Como previu Câmara, as críticas foram imediatas. O presidente em exercício da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Eduardo Moreira Ferreira, enfatizou que a decisão do Copom foi equivocada. ??Não compartilhamos da visão do Copom no que se refere à necessidade de elevação da taxa básica. A alta dos juros é danosa à produção e aos investimentos??, ressaltou. Para o empresário, a economia não está enfrentando pressões inflacionárias pelo excesso de consumo, o que justificaria a subida da Selic.
??Recentemente, a inflação mostrou certa renitência à queda, devido a choques de oferta externos (o encarecimento do petróleo e de matérias-primas como o aço e os plásticos) e a resquícios de indexação (reajuste das tarifas públicas). Agora, não há pressões generalizadas de preços que justifiquem a intenção de desaquecer a economia??, disse Ferreira. Que arrematou: ??A indústria se aproxima do nível máximo de utilização da capacidade produtiva. Ao aumentar os juros, o BC passa sinais negativos às decisões de investimentos que podem resultar em problemas futuros de falta de capacidade de produção??.
O comércio endossou as queixas contra o BC. ??O aumento da Selic representa uma involução da atividade comercial do país??, reclamou o presidente da Confederação Nacional dos Diretores Lojistas (CNDL), Carlos Henrique Levandowski. Para o presidente da Federação do Comércio de São Paulo (Fecomércio-SP), Abram Szajman, os efeitos do aumento da Selic já estão sendo sentidos no mercado com a elevação dos juros cobrados dos consumidores nos crediários. ??O comércio vai sofrer com isso??, frisou.
País refém
Na avaliação da economista Zeina Latif, do Banco HSBC, ao aumentar a Selic em 0,5 ponto percentual, o BC mostrou que a economia está refém das expectativas inflacionárias. Se o pessimismo quanto ao futuro dos índices de preços não se reverter rapidamente, o país terá de conviver com juros mais elevados. Zeina disse que a decisão do Copom tende a piorar o humor do mercado no curto prazo, ainda que o novo aumento dos juros não signifique que o atual crescimento econômico será abortado.
??A pergunta que vai tomar conta dos analistas é a seguinte: será que o BC está dizendo coisas que o mercado não está enxergando? Será que há mais riscos que o previsto em relação aos rumos da inflação??? questionou Zeina. Para ela ? que apostava, como quase todo o mercado, em 0,25 ponto de aumento nos juros ?, o Comitê deveria ter sido menos agressivo para se certificar melhor sobre os riscos inflacionários, pois a atividade econômica está em fase de transição para um ritmo moderado e a inflação está perdendo fôlego.
Segundo o economista-chefe do Banco Schahin, Cristiano Oliveira, o cenário econômico para os próximos meses é de incertezas e não permite definir qual a taxa real de juros (que desconta a inflação) necessária para manter os índices de preços sob controle. Por isso, a Selic vai continuar subindo até o final do ano, podendo chegar aos 17,25% em de dezembro.
No entender de Nuno Câmara, do Dresdner Bank, o Copom deverá fazer uma parada estratégica em novembro para avaliar melhor o desempenho da economia e da inflação. ??Em dezembro, a Selic subirá novamente, em 0,25 ponto, para voltar a cair a partir do segundo trimestre de 2005, quando certamente a inflação já estará dentro das metas definidas pelo governo??, afirmou Câmara.
Fonte: Correio Web