Quatro meses só para impostos
Até o dia 25 de maio, todo o rendimento do trabalhador brasileiro, desde o início do ano, é utilizado para o pagamento de impostos referentes a 2007. Grande parte da população desconhece a elevada carga tributária paga pelos produtos adquiridos no seu cotidiano. Para alertar o cidadão, diversas entidades realizam mobilizações e ações em todo o País procurando conscientizar e mostrar formas de reverter a situação.
A Associação da Classe Média (Aclame) realiza nesta data, desde 2004, o Dia da Liberdade de Impostos, onde leva a uma cidade gaúcha - este ano será em Novo Hamburgo - orientação e mercadorias com preços isentos das taxas embutidas no valor final. Outra iniciativa, esta de âmbito nacional, o projeto De Olho no Imposto, que propõe a inclusão dos valores dos tributos nas notas fiscais de produtos ou serviços, foi votada no Senado e irá à aprovação na Câmara dos Deputados nos próximos dias. Contadores, tributaristas e empresários são unânimes em apontar a carga tributária como um dos entraves ao crescimento da economia do Brasil. A realização de mudanças na legislação do setor é uma das maiores reivindicações e as ações desenvolvidas junto à sociedade buscam alertar para esta necessidade.
Segundo o presidente do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas da Serra Gaúcha (Sescon/Serra Gaúcha), Marco Dal Pai, o projeto De Olho no Imposto, se aprovado no Congresso Nacional, não apresentará dificuldades para ser colocado em prática. "Ele não é difícil de operacionalizar, nem onera as empresas. Entretanto, causará um impacto nos cidadãos, que perceberão quanto de impostos pagam por um pão francês, uma televisão ou outros produtos", afirma.
A campanha foi organizada pela Associação Comercial de São Paulo, com mobilização de entidades representativas de empreendedores, de profissionais liberais e de trabalhadores. Dal Pai diz que a carga tributária elevada, que representa 38% do Produto Interno Bruto (PIB) deve ser reduzida, para evitar que muitas empresas caiam na informalidade. "Empreendedores em início de carreira recorrem à informalidade por não ter condições de pagar a grande quantidade de impostos existentes e sobreviver."
A solução do problema, conforme Dal Pai, passa pela reestruturação da máquina do governo. "As despesas elevadas com a Previdência Social e outros custos levam a União a repassar esses valores nos impostos. A redução dos impostos pode sim trazer uma arrecadação maior, uma vez que a fiscalização realizada, tanto pela Receita Federal quanto pelas receitas estaduais, tem mostrado-se eficiente no combate à sonegação", garante.
O advogado Rafael Pandolfo lembra que, além das obrigações que atingem a receita bruta (PIS e Cofins, principalmente) o sistema tributário brasileiro apresenta uma interminável quantidade de obrigações chamadas acessórias. "Embora não deflagrem uma obrigação tributária em sentido, estrito, criam deveres burocráticos que geram um enorme custo administrativo e documental às empresas."
Pandolfo diz que um empresário, dependendo do segmento e da margem de lucro existente, pode gastar até 50% com os tributos que incidem sobre o consumo (ICMS, IPI, ISS), os que incidem sobre a receita bruta (PIS, Cofins), os que incidem sobre o lucro (IR, CSLL) e aqueles que incidem sobre despesas (contribuições para o INSS, Cides).
Entidades buscam conscientizar cidadão A Associação da Classe Média (Aclame) realizará as ações e promoções que marcam o Dia da Liberdade de Impostos neste ano em Novo Hamburgo. Conforme o presidente da entidade, Fernando Bertuol, o posicionamento da associação não é contrário à cobrança de impostos, mas sim contra os altos valores pagos pela sociedade. "Não queremos o fim dos tributos, mas que eles sejam empregados corretamente, fazendo com que a população diminua seus gastos em vários benefícios, como saúde, segurança e educação", diz Bertuol.
No ano passado, em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) a Aclame iniciou um programa de educação sobre o sistema tributário em algumas escolas. "Explicamos como é a nota fiscal, o que são os impostos, quais os tributos cobrados pelos produtos." Atualmente, 76 escolas municipais de Novo Hamburgo fazem parte do projeto, totalizando 2,6 mil alunos. Bertuol diz que o número atingido pelo projeto vai além disso, uma vez que as crianças repassam os conhecimentos aprendidos em casa para pais, irmãos e amigos.
Na campanha realizada pela Aclame no próximo dia 25, 1,5 mil alunos participarão da Caminhada da Consciência Tributária pelas ruas de Novo Hamburgo. Divididas em seis alas, elas apresentarão os temas relacionados à questão dos impostos, como a distribuição da carga tributária entre os governos, o peso dos tributos em cada tipo de produto e o destino do dinheiro arrecadado. "Queremos que as pessoas saibam que o município fica com a menor parte dos tributos, apenas 7%. Ao Estado cabe 25% e ao governo federal 68%", explica.
A Secretaria Estadual da Fazenda também realiza um programa de educação fiscal nas escolas desde 2003. Segundo o assessor de Promoção e Educação Tributária da Receita Estadual, Alexandre Luiz Bortolini, o projeto faz parte do Programa Nacional de Educação Fiscal e é realizado em parceria com os municípios. "A missão é formar o cidadão e conscientizar a sociedade dos seus direitos e deveres como usuários do serviço público." O projeto desenvolvido pela Secretaria Estadual da Fazenda capacita os professores da rede pública a ensinarem aos alunos, independente da disciplina sobre temas como por que são pagos os impostos, qual a sua importância e o que é feito com o dinheiro arrecadado.
"Formamos disseminadores de educação fiscal, já temos mais de 2 mil professores que participaram dos seminários no Rio Grande do Sul", diz Bortolini. Até dezembro do ano passado, educadores de 253 municípios participaram do projeto. No total, desde sua implantação, 7 mil professores participaram do programa.
A Secretaria da Fazenda não dispõe ainda dos números de alunos que foram instruídos em educação fiscal, mas pretende montar indicadores para medir os resultados da abrangência do projeto até o final de 2007. "Percebemos que nos locais onde o programa é implantado o aluno valoriza mais a escola, diminuem as pichações e depredações, por exemplo. Ele dá mais valor aos bens que são oferecidos a ele", destaca Bortolini.
Questão socioambiental influenciará tributação no futuro
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), Gilberto Luiz do Amaral, a tributação brasileira nos próximos anos levará em conta as questões ambientais e sociais. Atualmente, ela está centrada nos impostos sobre a produção de bens e serviços, traduzidos sobre o consumo, e na tributação direta sobre os salários. "A tributação sobre a produção e consumo, composta pelo ICMS, PIS, Cofins, IPI, parte da CPMF e IOF, resulta em 49% de toda a arrecadação nos três níveis, enquanto a feita sobre os salários, que é o Imposto de Renda, a Contribuição Previdenciária e Sindical, arrecada 27% do total", diz.
Amaral lembra que existe ainda a arrecadação sobre capital e outras rendas (Imposto de Renda das empresas, parte do IOF e CPMF) com 16% do total, comércio exterior (Imposto de Importação, Imposto de Exportação, taxas alfandegárias) com 3% do total, patrimônio (IPTU, IPVA, ITCMD, ITBI) com 2% da arrecadação total e 3% para os demais tributos. Estudos do IBPT para o período 2007/2010 indicam que o cenário político-econômico do Brasil está moldado em gastos públicos elevados, juros em queda, dívida externa controlada, dívida interna em elevação, baixa inflação, falta de investimentos em infra-estrutura, apreciação do real em relação ao dólar, dificultando as exportações de manufaturados e incentivando as importações. Nos próximos anos, o presidente do IBPT acredita que a tributação estará intimamente ligada às questões sociais e ambientais. "Teremos um sistema tributário híbrido, em que os tradicionais conceitos de impostos, taxas e contribuições terão de ser revistos. Haverá a quebra de vários paradigmas, como por exemplo de que não se pode tributar de maneira diferente produtos iguais, mesmo que utilizem matérias-primas diferentes", destaca. Amaral explica que, se determinado produto for fabricado com matéria-prima que agrida o meio ambiente, ele será altamente taxado. Já o similar que utilize matéria-prima corretamente ecológica terá uma tributação amena.
As questões sociais também serão levadas em conta quanto à tributação. Hoje, por exemplo, o carvão que é consumido em churrasqueiras é tributado da mesma maneira, independente da forma que é produzida a matéria-prima usada e da mão-de-obra empregada no processo. "Se a fábrica usar mão-de-obra infantil ou não der boas condições de trabalho na fabricação do produto, ela poderá ter uma tributação acentuada, enquanto aquela que é social e ambientalmente responsável terá uma tributação menor."
Amaral acredita que haverá uma menor quantidade de tributos com a simplificação na arrecadação de muitos deles. A implantação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) seria o passo inicial rumo a esta realidade.
Campanha disponibiliza produtos isentos de taxas
No Dia da Liberdade de Impostos, a Associação da Classe Média (Aclame) oferecerá à população de Novo Hamburgo vários produtos livres dos tributos normalmente embutidos no seu preço final: um automóvel zero quilômetro, computadores, 9 mil litros de combustível, cestas básicas e televisões de 20 polegadas.
Demonstrando o peso das taxas no bolso dos cidadãos, serão vendidos nos estabelecimentos comerciais da cidade 9 mil litros de gasolina a R$ 1,25 o litro, 20 computadores Celeron 2.66, com HD de 80 GB e gravador de DVD por R$ 622,00 cada, 200 cestas básicas com 28 itens alimentícios por R$ 68,46 cada e 30 televisores de 20 polegadas por R$ 259,00 cada. O automóvel, um Ford Ka 0km, será vendido por R$ 13 mil iniciais, acrescidos da maior doação feita em envelope no nome da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) de Novo Hamburgo.
Para adquirir os produtos, os interessados devem comparecer à Praça 20 de Setembro na manhã do dia 25, onde uma banca armada entregará senhas para os primeiros que lá chegarem. Depois, basta ir às lojas conveniadas, apresentar a senha e fazer o pagamento à vista. Para a gasolina, os motoristas deverão ir diretamente a um dos três postos autorizados e fazer fila para aguardar o atendimento (gasolina comum, máximo de 20 litros por cliente e 3 mil litros em cada posto).
Fonte: Jornal do Comércio