Apenas R$ 633 bilhões a receber
O governo federal teria condições de abrir mão da cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) por 15 anos se conseguisse executar R$ 633 bilhões em dívidas que tem a receber, entre outros, de empresas, pessoas físicas e políticos multados pela Justiça Eleitoral. Datado de setembro, o valor, que também supera os R$ 503,9 bilhões em investimentos previstos até 2010 no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), está inscrito na chamada Dívida Ativa da União.
E, segundo dados oficiais, cresce ano após ano. Em 2003, era de R$ 211 bilhões. Em 2005, saltou para R$ 334 bilhões. Hoje, seria de ?apenas? R$ 433 bilhões, mas R$ 200 bilhões devidos ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foram incluídos no grupo, na esteira da criação da Super-Receita. Para o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, o governo tem de aprovar a autonomia da advocacia pública para dar fôlego à recuperação dos créditos. O desempenho hoje é tímido.
Neste ano, por exemplo, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) espera recuperar cerca de R$ 2,8 bilhões dos créditos inscritos na Dívida Ativa da União. Britto alega que, com a autonomia, a advocacia pública se tornará um agente de combate à corrupção, atacando o bolso do corruptor. Além disso, terá atuação mais ativa na cobrança dos devedores da União. Hoje, segundo Britto, a prioridade é desmontar esqueletos financeiros que assombram o caixa da União. Um erro, opina.
?Se agir nesse sentido, a arrecadação será bem maior do que a da CPMF, com a vantagem de punir o corrupto e o sonegar?, diz Britto. No próximo ano, a CPMF renderá R$ 40 bilhões, 15,8 vezes a menos do que o estoque da Dívida Ativa da União. Procurador-geral adjunto da Fazenda Nacional, Agostinho Netto declara que o resultado da cobrança é baixo porque, entre outros, a legislação dá ao devedor a possibilidade de apresentar uma série de recursos à Justiça a fim de impedir o acerto de contas.
Ele defende mais investimentos do governo na equipe responsável pela cobrança ? hoje, cada um dos 600 procuradores que lidam com a dívida ativa cuida de cerca de 5,9 mil processos judiciais de execução. Se adotada, a medida desestimularia a sonegação e, assim, contribuiria para estimular a concorrência em pé de igualdade. Netto faz questão de ressaltar, no entanto, que não considera correta qualquer relação entre a recuperação de créditos e a CPMF.
Afinal, mesmo que o desempenho crescesse 100%, a arrecadação saltaria de R$ 2,8 bilhões para R$ 5,6 bilhões, quantia que não faz frente aos recursos amealhados com a contribuição. ?Não tem comparação em ordem de grandeza.?
Penhora de contas
Responsável pela cobrança de créditos inscritos na Dívida Ativa da União, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) trabalha para convencer o governo a enviar ao Congresso um projeto que lhe garanta o direito de executar devedores sem autorização prévia da Justiça. A idéia é dar à Receita poder para, por exemplo, penhorar diretamente contas bancárias.
Apresentado no início do ano, o texto foi bombardeado por juristas, como Ives Gandra da Silva Martins. Recebeu a pecha de fascista, por desconsiderar a exigência de aval do Judiciário para a penhora. A resistência não foi capaz de arquivar a iniciativa, que foi discutida na semana passada com integrantes da Justiça Federal, segundo o procurador Agostinho Netto.
Defensor da proposta, ele considera pouco eficazes as armas de cobrança atuais. Ressalta, no entanto, que o trabalho é feito com afinco. Prioriza os grandes devedores e recorre à aplicação de restrições, como a inclusão do devedor em cadastros negativos de crédito. ?Quanto mais recente o crédito, maior a chance de recuperação?, afirma Netto. Até 1996, houve 400 mil inscrições na dívida ativa, somando pouco mais de R$ 20 bilhões. Desde então foram mais de 6,5 milhões de inscrições, envolvendo cerca de R$ 400 bilhões.
Regras flexíveis Para o ex-ministro da Previdência e líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), deveriam ser adotadas regras mais flexíveis, que propiciassem um encontro de contas entre União e devedores. Uma empresa aérea, por exemplo, poderia pagar parte do débito com passagens. ?Sem mecanismos heterodoxos, o governo não tem condição de receber. O problema é que mecanismo heterodoxo não serve no serviço público?, diz Jucá.
Tanto o senador como Netto lembram que parte da dívida ativa hoje não é mais recuperável. O procurador estimava em 50% o crédito pobre. Agora, espera o resultado de um trabalho em curso para saber exatamente o percentual. (DP)
Fonte: Correio Braziliense - DF